HUMANIZAÇÃO E SAÚDE NA TERCEIRA IDADE: UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO MULTIPROFISSIONAL
Resumo
Introdução: Segundo o artigo 230 da Constituição Federal, a família, a sociedade e o estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. Porém o que tem sido encontrado na literatura é que a qualidade de vida nas instituições de longa permanência para a terceira idade não é satisfatória, afetando todos os aspectos de sua saúde (todo seu completo bem-estar físico, mental e social).Ademais, a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, nos artigos 7 e 8, enuncia a obrigatoriedade do respeito à vulnerabilidade humana e à integridade pessoal, afirmando que a vulnerabilidade humana deve ser levada em consideração, e que grupos especialmente vulneráveis devem ser adequadamente protegidos, visando garantir o respeito pela dignidade humana nas situações em relação às quais a autonomia e o consentimento se manifestam insuficientes, no entanto, mesmo em tais situações, as pessoas devem poder participar o máximo possível no processo de decisão.Devemos considerar que um idoso bem cuidado é um ganho não só pessoal (para sua própria saúde biopsicossocial), mas também para a sociedade, uma vez que reflete em um menor número de doenças crônicas relacionadas ao envelhecimento, em uma melhoria na cognição, na comunicação, em aspectos psicofisiológicos como a depressão, impactando positivamente para uma menor sobrecarga do sistema de saúde e em uma sobrevida com o idoso em atividade profissional, o que reflete de forma positiva no que se trata do aspecto econômico da sociedade. 1Em estudos 2, ao comparar três asilos e analisar a qualidade de vida de seus moradores, encontrou-se que a qualidade de vida de idosos institucionalizados tende a ser ruim, principalmente em instituições que não oferecem alternativas como recreação e fisioterapia. Constatou-se ainda que, antes de serem institucionalizados, tanto os homens quanto as mulheres realizavam atividades rotineiras, o que favorecia a manutenção da autonomia e independência, entretanto após a institucionalização, em virtude da escassa atividade sugerida, muitos perdiam a capacidade funcional. 3 Esses resultados sugerem que, em decorrência da forma como a maioria das instituições trata os idosos, a tendência é que os mesmos se tornem pessoas dependentes e incapacitadas, o que pode ser um fator desencadeante para uma gama de patologias físicas e mentais, como a depressão. O objetivo do presente trabalho é relatar a experiência de um projeto de extensão realizado entre maio e novembro do ano de 2019 em uma cidade mineira, o qual visava levar atividades de aos idosos de dois asilos, estimulando o estudo do assunto e o trabalho conjunto entre discentes e docentes de cursos da saúde da Universidade. Metodologia: Os participantes do projeto dedicaram 10 horas semanais ao mesmo, sendo duas horas por dia de segunda a sexta-feira. Nas segundas, quartas e quintas, aconteceram os encontros teóricos, os quais perpassaram diversos temas, tais como: relação profissional-paciente e suas diversas nuances, humanização, empatia, transferência, contratransferência, processo de luto, importância da espiritualidade, importância de terapias alternativas, cuidados paliativos, diversidade sociocultural dos idosos do asilo, alteridade entre outros assuntos que surgiram no decorrer do projeto. Nos demais dias, ocorreram as visitas ao asilo, em que foram desenvolvidas atividades previamente programadas pela equipe executora. Dentre as atividades realizadas destacam-se as seguintes: rodas de conversa com os idosos sobre assuntos solicitados por eles mesmos (sexualidade, os problemas da polifarmácia, dificuldades de locomoção, morte e luto, solidão, entre outros), pintura de telas e exposição das pinturas realizadas, tarde de apresentações musicais, tarde de lanche em grupo, tarde de salão de beleza e oficina de tricot. Ao fim das atividades, os discentes conversavam individualmente com cada idoso, perguntavam como avaliavam a atividade do dia e pediam alguma sugestão para atividades futuras. Resultados: Em todos os relatos dos idosos, ao final das atividades, observou-se que viam a atividade como um momento em que não se sentiam sozinhos e que os fazia se sentir valorizados. A atividade de exposição das telas pintadas por eles foi a mais bem avaliada, sendo que muitos pediram que fosse repetida. Os idosos relataram que o principal ponto positivo foi o sentimento de valorização proporcionado ao verem suas obras sendo admiradas por outras pessoas. As rodas de conversa foram bem avaliadas, visto que proporcionaram um momento para tirarem duvidas sobre diversos assuntos relacionados a sua saúde. As mulheres relataram que havia anos desde a última vez em que foram ao salão de beleza (algumas relataram nunca terem ido), tornando essa atividade muito bem avaliada pelo publico feminino do asilo. Algumas relataram que sonhavam pintar o cabelo novamente, para lembrar da juventude, entretanto nunca tinham a oportunidade, a qual foi realizada pelo projeto, que forneceu as tintas de cabelo. Com relação aos discentes e docentes participantes, a avaliação se mostrou positiva, visto que o projeto possibilitou a oportunidade de colocar em prática o que viram na teoria em sala de aula e de ter contato com profissionais de outras áreas, podendo trabalhar em um contexto multiprofissional. Discussão: Conforme encontrado na literatura4,5, o que mais pesa negativamente na imagem que os idosos fazem das Instituições de longa permanência é o fato de pessoas com Alzheimer ou outras doenças demenciais serem tratadas como crianças e a sensação de que, ao entrarem, nunca mais sairão. Realidade esta que se agrava associada à possibilidade de rompimento dos vínculos afetivos, a perda do contato com a família e com os amigos, visita pouco freqüente e a impossibilidade de passarem o dia fora quando quiserem. Para muitos idosos, o dia a dia na instituição significa ócio e monotonia, resumindo-se, basicamente, segundo suas próprias palavras, em ‘comer, dormir, e assistir televisão'. Humanizar a assistência em saúde significa dar lugar à palavra do usuário e à palavra dos profissionais da saúde, de forma que possam fazer parte de uma rede de diálogo que pense e promova as ações, as campanhas, os programas e as políticas assistenciais a partir da dignidade ética da palavra, do respeito, do reconhecimento mútuo e da solidariedade. 5,6 Entretanto, a falta de condições físicas e técnicas em muitos asilos acabam impedindo essa assistência à saúde de forma dialógica, seja por falta de capacitação ou materiais, tornando o atendimento desumanizante pela má qualidade, resultando num atendimento de baixa resolubilidade. Tal falta de condições técnicas e materiais também pode induzir à desumanização na medida em que profissionais e usuários se relacionem de forma desrespeitosa, impessoal e agressiva, piorando uma situação que já é precária. Ademais, não se pode ignorar o fato de que cotidianamente, os idosos brasileiros convivem com angústias como a desvalorização das aposentadorias e pensões, com medos e depressão, com a falta de assistência e de atividades de lazer, com o abandono em hospitais ou asilos, além de enfrentar, ainda, todo o tipo de obstáculos para assegurar alguma assistência por meio de planos de saúde. À desinformação, ao preconceito e ao desrespeito aos cidadãos da terceira idade somam-se a precariedade de investimentos públicos para atendimento às necessidades específicas da população idosa, a falta de instalações adequadas, a carência de programas específicos e de recursos humanos, seja em quantidade ou qualidade.7 Tais condições de precariedade de humanização dos asilos foi notado no presente trabalho, corroborando o que foi encontrado na literatura. Em algumas pesquisas encontradas 7, houve uma seleção de idosos para a formação de um grupo de atividades lúdicas, no qual a pessoa idosa revelasse sua criatividade, experiência e sabedoria. No desenvolvimento do trabalho, utilizaram-se de atividades que enfocavam o diálogo, o teatro, momentos de contar histórias, atividades de pintura e músicas e observaram que essa aproximação através da arte foi efetiva e conseguiu impactar de forma positiva todas as nuances da saúde do idoso. Tal resultado foi igualmente observado no presente projeto, por meio dos depoimentos dos idosos participantes. Conclusão: Projetos de extensão que objetivem trabalhar a humanização no cuidado do idoso são de extrema importância pelo seu benefício para a comunidade idosa e para o aprendizado multidisciplinar dos discentes da universidade.
Referências
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FREITAS, Mariana Ayres Vilhena de; SCHEICHER, Marcos Eduardo. Qualidade de vida de idosos institucionalizados. Rev. bras. geriatr. gerontol., Rio de Janeiro , v. 13, n. 3, p. 395-401, Dec. 2010 .
OLIVEIRA, Érika Arantes de; PASIAN, Sonia Regina and JACQUEMIN, André. A vivência afetiva em idosos. Psicol. cienc. prof. [online]. 2001, vol.21, n.1, pp.68-83.
CAMPOS, Cássia Noele Arruda et al . Reinventando práticas de enfermagem na educação em saúde: teatro com idosos. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro , v. 16, n. 3, p. 588-596, Sept. 2012 . Available from . access on 11 May 2018.
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